2010-07-14

* A ORGULHOSA

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Trasíbulo Ferraz Moreira

Num Baile.
Ainda há pouco pedi-te,
Pedi-te para valsar...
Disseste - és pobre, és plebeu;
Não me quiseste aceitar!
No entretanto ignoras
Que aquele a quem tanto adoras,
Que te conquista e seduz,
Embora seja da "nata",
É plena figura chata,
É fósforo que não dá luz!
Deixa-te disso, criança,
Deixa de orgulho, sossega,
Olha que o mundo é um oceano
Por onde o acaso navega.
Hoje, ostentas nas salas
As tuas pomposas galas,
Os teus brasões de rainha;
Amanhã, talvez, quem sabe?
Esse teu orgulho se acabe,
Seja-te a sorte mesquinha.
Deixa-te disso, olha bem!
A sorte dá, nega e tira;
Sangue azul, avós fidalgos,
Já neste século é mentira.
Todos nós somos iguais;
Os grandes, os imortais;
Foram plebeus como eu sou.
Ouve mais esta lição:
Grande foi Napoleão,
Grande foi Victor Hugo.
Que serve nobre família,
Linhagem pura de avós?
Se o sangue dos reis é o mesmo,
O mesmo que corre em nós!
O que é belo e sempre novo
É ver-se um filho do povo
Saber lutar e subir,
De braços dados com a glória,
Para o Pantheon da História,
Para conquista do porvir.
De nada vale o que tens
Que não me podes comprar;
Ainda que possuísses
Todas as pérolas do mar!
És fidalga? - Sou poeta!
Tens dinheiro? - Eu a completa
Riqueza no coração;
Não troco uma estrofe minha
Por um colar de rainha
Nem por troféus de latão.
Agora sim, já é tempo
De te dizer quem sou eu,
Um moço de vinte anos
Que se orgulha em ser plebeu,
Um lutador que não cansa,
Que ainda tem esperança
De ser mais do que hoje é,
Lutando pelo direito,
Para esmagar o preconceito
Da fidalguia sem fé!
Por isso quando me falas,
Com esse desdém e altivez,
Rio-me tanto de ti,
Chego a chorar muita vez.
Chorar sim, porque calculo,
Nada pode haver mais nulo,
Mais degradante e sem sal
Do que uma mulher presumida,
Tola, vaidosa, atrevida.
Soberba, inculta e banal.
 
 
 
 
 
 
 
* Poema referência na Crônica NUM BAILE, de Welington Almeida Pinto, novembro de 2007.
 
** Apesar de muita gente dar autoria a esses versos a Castro Alves
(1847-1871), são do poeta e jornalista baiano Trasíbulo Ferraz Moreira,
nascido em Lenções, na Chapada Diamantina, em 28 de janeiro do 1870. Ele
frequentou as faculdades de Direito do Recife e da Bahia, até o quarto ano.
Antes de concluir o curso, morreu por moléstia pulmonar. Foi redator-chefe
da "Gazeta de Notícias" de Salvador, onde também publicou poesia, contos e
crônicas. Autor do livro de contos "Poliformes" , publicado em 1896.